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INCÊNDIOS EM TIRADENTES E BARBACENA ALERTAM PARA O PERIGO DA VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER NO ISOLAMENTO SOCIAL

Najla Passos *
Da Editoria

Na última quarta (8), um homem de 37 anos ateou fogo na casa da ex-companheira, de 65 anos, no bairro Recanto da Serra, em Tiradentes. O fogo destruiu móveis, colchões, pertences pessoais e diversas roupas da moradora, que não ficou ferida. o agressor fugiu do local, mas acabou preso.

No dia 27 de março, um homem de 46 anos colocou fogo na sua casa, no bairro Água Santa, em Barbacena, porque ficou com ciúmes da companheira. O agressor acabou ferido e foi encaminhado para o Hospital Regional pelo Corpo de Bombeiros. O fogo que destruiu móveis e utensílios domésticos da residência.

Em tempos de isolamento social, a violência domestica contra a mulher preocupa. De acordo com a diretora de Formação do Sindicato Único dos Trabalhadores da Educação de São João del-Rei (SindUte SJDR), Marina Campos, o confinamento tem sido causa do aumento da violência contra a mulher em todo o mundo.

“Na China, este índice é exorbitante. Na França, Itália e nos países europeus que estão sendo mais afetados, isso também cresce frequentemente. Isso acontece porque, neste período, as mulheres convivem mais com seus agressores, que são maridos, companheiros, pais e irmãos, ou seja, aqueles que convivem na mesma casa”, explica.

Uma pesquisa realizada em São João del-Rei revela que 93,9% das mulheres vítimas de violência não formalizaram denúncia à Polícia

Segundo ela, no Brasil, vários estados também já apontam aumento da violência contra a mulher, com destaque para o Rio de Janeiro, onde o crescimento foi de 50%. No Campo das Vertentes, porém, as notificações da Polícia Civil revelam redução no número de casos, em relação ao mesmo período do ano passado.

Em Barbacena, foram 92 casos registrados em março deste ano, contra 109 no mesmo período do ano passado. Em São João del-Rei, que engloba Tiradentes, também houve redução. Foram 36 casos registrados em março deste ano, contra 43 no ano passado.

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A realidade das subnotificações

Mariah Barcelos, estudante de Arquitetura de Urbanismo da UFSJ.
Foto: Arquivo pessoal

“A subnotificação é alta em qualquer contexto. As mulheres têm medo da super exposição, do julgamento da sociedade e de sofrer novas violências dos agressores. Além disso, não acreditam na eficácia do sistema judicial brasileiro”

Os registros da Polícia Civil escondem uma triste realidade da violência doméstica: a subnotificação. Por medo, vergonha da exposição e falta de fé da Justiça muitas mulheres sofrem caladas as agressões cotidianas nos seus lares.

“A subnotificação é alta em qualquer contexto. As mulheres têm medo da super exposição, do julgamento da sociedade e de sofrer novas violências dos agressores. Além disso, não acreditam na eficácia do sistema judicial brasileiro”, afirma a estudante de Arquitetura e Urbanismo da UFSJ, Mariah Barcelos, autora de um estudo sobre o tema em São João del-Rei.

Na pesquisa, a estudante ouviu 471 mulheres, por meio de formulário online, divulgado com a ajuda de coletivos feministas da região. Os resultados são estarrecedores: 45,9% das mulheres ouvidas já sofreram algum tipo de violência e em 58,5% dos casos, o abusador era marido, namorado, parente, amigo, chefe ou conhecido.

A pesquisa revela também o tipo de violência predominante: 41% das mulheres foram vítimas de assédio; 16,4%, de violência psicológica; 13%, de moral; e 11,6%, de sexual. Mas o que mais impressiona é que 93,9% das mulheres vítimas de violência em São João del-Rei não formalizaram denúncia à Polícia.

Carência de políticas públicas

Mariah Barcelos avalia que faltam políticas públicas para reduzir a violência contra a mulher. E dentro destas políticas, ela destaca a do direito à informação como uma das principais. “A informação é o principal ponto de partida para qualquer mudança que a gente queira, principalmente mudança social e política”, afirma.

Segundo ela, as mulheres que mais sofrem com a violência são aqueles que se encontram em situação de vulnerabilidade social. “Elas estão distantes da informação, tanto sobre seus direitos como cidadã quanto dos conteúdos feministas e empoderadores, que façam com que elas saiam dessa situação de vítimas da violência para a de atuantes contra a violência”, diz a estudante.

Diretora de Formação do SindUte SJDR, Marina Campos. Foto: Arquivo pessoal.

“Nós precisamos de políticas públicas que atendam estas mulheres que não tem condições ficarem em casa convivendo o tempo todo com seus agressores”

Marina Campos também critica a falta de políticas públicas para o enfrentamento da problema. “Países como a França, além de criar hospitais para lidar com o novo coronavírus em si, entendem a política de proteção as mulheres como eixo central e, por isso, começaram a abrir também casas de acolhimento para mulheres em situação de violência”, exemplifica.

Ela lembra que, nestes tempos de pandemia de novo coronavírus, as delegacias da Mulher estão recebendo denúncias apenas pelo telefone, o que dificulta ainda mais o atendimento às vítimas. “A gente sabe que parte da rede, que recolhe as denúncias, que é o número 180, continua funcionando, mas a efetividade do encaminhamento destes casos tem deixado muito a desejar do ponto de vista de políticas públicas”, alerta Marina.

A diretoria do SindUte SJDR corrobora a afirmação de Mariah de que a violência doméstica atinge principalmente as mulheres negras, pobres e periféricas. “Nós precisamos de políticas públicas que atendam estas mulheres que não tem condições ficarem em casa convivendo o tempo todo com seus agressores. E a gente vê que o Brasil deixa muito a desejar o atendimento específico às mulheres que estão em situação de violência doméstica”, reivindica.

  • Colaboraram com a reportagem Carol Rodrigues e Rhayssa Souza

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