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SUSPENSÃO DAS ATIVIDADES DOS BOMBEIROS VOLUNTÁRIOS DE TIRADENTES REVOLTA POPULAÇÃO E GERA POLÊMICA

Foto: Divulgação/SCBVT

Daniela Mendes
Especial para o Notícias Gerais

Os 7,9 mil habitantes de Tiradentes se surpreenderam ao serem informados, por meio de uma nota da Sociedade Corpo de Bombeiros Voluntários Tiradentes (SCBVT), que a brigada, considerada patrimônio da cidade, não pode mais atuar no combate aos incêndios, resgates de pessoas e animais, além de outras outras ações que desempenhava há 28 anos. 

A suspensão das atividades se deve à determinação do Corpo de Bombeiro Militar de Minas Gerais, em função da SCBVT não atender normas previstas na Portaria Normativa 33/2018 para a atuação de brigadas voluntárias. A entidade, inclusive, aplicou uma multa de R$ 3,7 mil à SCBVT por atuar sem a devida regularização.

O secretário-geral da SCBVT, Jonathan Geraldo da Silva, disse que a instituição enviou ao Corpo de Bombeiros uma defesa, na tentativa de impedir a multa. Sem sucesso, agora a entidade deve arcar com R$ 3,7 mil, valor que não dispõe no momento. “Para piorar, por causa da pandemia da Covid-19, o processo de licenciamento não pode ser concluído e a previsão é que Tiradentes fique sem bombeiros até 2021”, afirmou.

“Para piorar, por causa da pandemia da Covid-19, o processo de licenciamento não pode ser concluído e a previsão é que Tiradentes fique sem bombeiros até 2021”

Secretário-geral da SCBVT, Jonathan Geraldo da Silva

Com isso, a corporação voluntária de 30 integrantes, não pode mais combater incêndios, fazer resgates em geral ou cumprir quaisquer outras atividades de antes até segunda ordem. Em caso de emergência, a população deve ligar para o 193 (Bombeiro Militar), 192 (SAMU) e 190 (Polícia Militar).

Agora, quem fica responsável por atender a pequena cidade de 7 mil habitantes são os bombeiros militares de São João del Rei, a uma distância de 12 quilômetros. Eles, por sua vez, pertencem à área de atendimento da 2ª Companhia Independente do 3º Comando Operacional, sediada em Barbacena. São 38 militares especializados em diversas atividades só em São João del Rei e 120 militares no total, contando com os de Barbacena, a 54 quilômetros.

Foto: Divulgação/SCBVT

Sem orientação

A SCBVT sabia que deveria se adequar às novas regras desde a promulgação da nova lei na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). O que Jonathan da Silva alega é que chegou ao conhecimento da instituição que isso se daria por etapas. Depois, com a portaria, percebeu-se que a mesma não atendia os aspectos da SCBVT dentro de um prazo muito curto estipulado. “Em vários momentos procuramos nos informar de modo informal, em trocas de ideias com profissionais da área, e, por fim, enviamos um ofício para que pudéssemos ser orientados. Essa orientação não chegou”, lamenta.

Silva explica que a SCBVT não atende à questão do enquadramento nas classificações da portaria por ser voluntária. E também teme que a entidade perca sua autonomia caso se torne brigada municipal. “Teríamos que estar subordinados ao município enquanto prefeitura e a instituição perderia sua possibilidade de ações em diversos aspectos”, justifica.

O Corpo de Bombeiros nega que não houve orientação. Para tanto, cita a legislação detalhada publicada no site oficial da instituição e a disponibilidade de outros canais de comunicação. E afirma que representantes da SCBVT foram recebidos pelo comandante-geral do Corpo de Bombeiros, coronel Edgard Estevo da Silva,  que, junto ao major João Guilherme e ao tenente Igor, esclareceram os procedimentos para regularização. 

“Eu acho um absurdo a Prefeitura não atuar em defesa deles. A gente vai depender de bombeiros de outros lugares quando a gente tem o nosso aqui”

Glória Petit Caputo, empresária

A Portaria 33

O que aconteceu com a SCBVT é o resultado de uma polêmica que já vem se arrastando desde 2018 no Estado, quando a Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) aprovou a Lei 22.839, que disciplina a atividade dos bombeiros civis.

Contudo, já existia uma lei federal, a 11.901/2009, que fixa as atividades que o bombeiro civil desempenha, classifica suas funções, estabelece sua jornada de trabalho e de descanso e lhe confere direitos que devem ser garantidos pelo empregador.

O objetivo da lei estadual é somente a disciplina de aspectos de direito administrativo, estabelecendo requisitos a serem observados pelos particulares interessados em desempenhar ações da atividade de bombeiros, como as de defesa civil e de prevenção e combate a incêndio.

Na lei estadual também ficou estabelecido que a aplicação das normas fica por conta do Corpo de Bombeiros. Para regulamentá-la, foi editada a Portaria 33, em julho de 2018. Foi quando começaram as polêmicas na categoria acerca das denominações utilizadas na atividade no Estado e outras questões técnicas.

O fato é que, em relação a SCBVT, o Corpo de bombeiros afirma compreender a dificuldade enfrentada no cotidiano da entidade, mas acrescenta que não considera pontos polêmicos ou inadequação de prazos. Justifica que a Portaria 33 vigora desde julho de 2018, portanto quase dois anos atrás, tendo sido concedido às pessoas jurídicas o prazo de seis meses para adequação. 

Além disso, afirma que recebeu os representantes da SCBVT no Comando-Geral da Corporação, onde os orientou a respeito dos procedimentos para regularização, que, segundo o CBMMG, não consumiriam recursos da entidade se atendidos.

Foto: Divulgação/SCBVT

Um caso à parte

A questão para a SCBVT é que a instituição não tem fins lucrativos como prevê a lei. Fundada oficialmente em 1992, já existia informalmente desde a década de 80 do século passado. Na época, não existia sequer bombeiro militar na região e o único objetivo destas pessoas sempre foi proteger o patrimônio cultural, humano e ambiental de Tiradentes.

“A instituição é voluntária e não foi enquadrada com amplitude na portaria, praticamente é citada, e é obrigada a se enquadrar em uma das categorias que são estipuladas”, explica Silva. “É difícil ser punido por querer ajudar, ainda mais quando se coloca em perigo para oferecer essa ajuda”, lamenta ele.

Durante todos estes anos, a SCBVT sobreviveu de contribuições voluntárias investidas em combustível, manutenção dos veículos, compra de equipamentos, uniformes e outras despesas. Além de doações espontâneas e um pequeno auxílio da Prefeitura de Tiradentes, através de uma subvenção mensal, e ações de mobilização da comunidade no sentido de manter a entidade de forma filantrópica.

Os membros da corporação são pessoas comuns, das mais variadas idades e profissões. São funcionários públicos, guias turísticos, carpinteiros, enfermeiros, universitários, donas de casa, entre outros, num total de 30 membros treinados, com 5 mulheres e maioria jovens com menos de 27 anos. “São pessoas com tamanha dedicação que, muitas vezes, até cobrem despesas com dinheiro próprio”, informou Jonathan da Silva.

“São pessoas com tamanha dedicação que, muitas vezes, até cobrem despesas com dinheiro próprio”

Secretário-geral da SCBVT, Jonathan Geraldo da Silva
Foto: Divulgação/SCBVT

Orgulho Tiradentino

Incentivados por vários órgãos oficiais ligados ao patrimônio histórico e ambiental, o grupo da SCBVT sempre se preocupou também com a devida capacitação e são muito atuantes no combate a incêndios florestais comuns na época de estiagem. Por isso, sua existência tem um significado muito maior para a pequena cidade turística.

Muitas foram as manifestações de indignação nas redes sociais. Em entrevista, a proprietária de um hostel, Glória Petit Caputo, disse que acha um absurdo o que está acontecendo e chegou a afirmar que a SCBVT deveria ser tratada como patrimônio da cidade. “Eu acho um absurdo a Prefeitura não atuar em defesa deles. A gente vai depender de bombeiros de outros lugares quando a gente tem o nosso aqui”, reclama e lembra da intensa atuação da SCBVT.

É que o grupo organiza muitas campanhas de conscientização na cidade e tem iniciativas fundamentais. Como, por exemplo, a criação de uma Brigada de Combate a Incêndios especificamente para combater os sinistros na serra de São José e região.

Proprietária de um espaço turístico na zona rural, Mariana Cavalcanti diz que seus familiares já estão treinados em ouvir incêndios na mata. Logo quando escutam o barulho, chamam os bombeiros voluntários. Os moradores tem canal direto com a SCBVT, que chega em tempo hábil. 

“Anualmente tem incêndio ao nosso redor, inclusive na minha nascente, que abastece um grande número de casas da região. Já perdi a conta de quantas vezes eles vieram ajudar”, afirma e lembra que incêndios assim ameaçam até as moradias mais próximas da mata.

A SCBVT também conquistou o Prêmio Rodrigo Melo Franco, em 1996 e, em 2004, o título de utilidade pública por meio da Lei Estadual nº 22.203/16 e na legislação municipal, além de vários outros prêmios e condecorações. Já atendeu 31,4 mil casos aproximadamente. Entre eles, primeiros socorros/APH, combate a incêndios florestais, incêndios em áreas rurais e urbanas, incêndios residenciais, vistorias em áreas de risco, atendimentos a eventos, campanhas de prevenção, entre outros.

“Anualmente tem incêndio ao nosso redor, inclusive na minha nascente, que abastece um grande número de casas da região. Já perdi a conta de quantas vezes eles vieram ajudar”

Maria Cavalcanti, empresária

Defesa Civil e Covid -19

Outra pergunta que paira entre os moradores nas redes sociais é a de que como o Corpo de Bombeiros se apressou tanto em suspender as atividades de uma instituição tão útil e necessária na comunidade num momento tão difícil de enfrentamento da Covid-19 no país e no mundo.

A instituição alega que a SCBVT foi fiscalizada em setembro de 2019, quando foi instaurado o procedimento administrativo. Portanto, não considera que tenha agido meio a pandemia provocada pelo coronavírus, já que a SCBVT foi autuada em outubro de 2019. Seguindo os trâmites, afirma que foi em 13 de março de 2020 que a sanção de interdição e multa se aplicou. Ou seja, em momento também anterior à decretação do estado de calamidade em Minas Gerais, que data de 20 de março de 2020.

Os bombeiros militares lembram que Tiradentes faz parte de uma área de 16 municípios atendidos pelo CBMMG. A instituição garante efetivo e equipamentos disponíveis na região adequadamente dimensionados para as ocorrências. Destaca ainda que os incêndios florestais que ocorrem na Serra de São José podem contar com o apoio operacional das demais unidades dos bombeiros militares da região e com apoio aéreo.

Além disso, o secretário geral da SCBVT, Jonathan Geraldo da Silva, afirma que os bombeiros voluntários realizam um trabalho técnico na defesa civil desde 2018. Assim, os membros podem ainda contribuir com a segurança dos cidadãos. Estão realizando rondas para instruir a população e ajudar na fiscalização do cumprimento do decreto municipal e não há motivos para preocupação num contexto de pandemia.

2 COMENTÁRIOS

  1. SCBVT sairá mais forte após todos esses percalços. Agora é aguardar, confiar e se manter tecnicamente habilitado para o retorno das atividades, tão logo sejam autorizadas. Tiradentes não ficará sem esse “patrimônio”.

  2. É só se regularizar junto a legislação estadual. e tá de boa…. O resto é desculpa esfarrapada e politicagem

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