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COLUNA AGRIDOCE: PRA LIVE QUE VOCÊ ME CONVIDOU, COM QUE ROUPA EU VOU?

Apesar da pandemia, o Sol há de brilhar mais uma vez. Foto: Diogo Santos
Douglas Caputo

Douglas Caputo*

A pandemia de Covid-19 inaugurou novas formas de interação, já que o distanciamento social é uma das medidas mais eficazes de prevenção da doença. As videoconferências, antes quase restritas aos ambientes corporativos, passaram a pipocar em diversos cenários, como no doméstico. Segundo o comunicólogo Jésus Martín-Barbero isso evidencia as mediações que as pessoas fazem a partir dos meios. 

O coronavírus não só ampliou a comunicação interpessoal mediada por dispositivos digitais, como superdimensionou um fenômeno da internet, as lives. O recurso deixou de ocupar pequenos guetos da rede e foi alçado ao caráter massivo. Famosos e anônimos disputam servidores de streamings – e o público. Não por acaso superproduções e até bizarrices tentam atrair a audiência.    

Conforme a Tubelab, empresa especializada em marketing de influência, a sertaneja Marília Mendonça está no topo das lives apresentadas até 30 de maio. Em duas transmissões, a cantora acumula 73 milhões de views. Gustavo Lima e Sandy & Junior são os que conseguiram mais doações de alimentos, mil toneladas cada. Já Anitta lidera a arrecadação de dinheiro para instituições filantrópicas, R$1 milhão. 

Enquanto os popstars seguem na batalha pelas massas, os menos conhecidos lutam para recompor a renda por meio de lives colaborativas. Impedidos de fazerem shows e sem perspectiva de quando retornarão aos palcos por conta da Covid-19, músicos de vários estilos contam com a colaboração financeira de internautas, já que as políticas públicas são ineficientes para o segmento artístico durante a pandemia. 

Nesse grupo, despontam alguns talentos que impressionam pela qualidade musical que entregam aos espectadores. Exemplo disso é o casal Fernanda Garcia e Pablo Falcão, que formam o Samba Artesanal. Moradores do Rio de Janeiro, os sambistas apresentam repertório de grandes nomes, mas numa interpretação ímpar segundo a crítica especializada, como afirmam os radialistas Adelzon Alves e Rubens Confete. 

O planger do violão de Pablo forma uma melodia harmônica com o mezzo-soprano de Fernanda. Ambientadas na sala de casa dos músicos, as lives trazem a malemolência festiva das rodas de samba. No entanto, as transmissões apresentam ainda a melancolia de letras que molham o pano da cuíca com lágrimas marcadas por uma interpretação robusta da dupla. 

Em conversa exclusiva com este colunista, Fernanda diz que suas referências são as icônicas Clara Nunes e Alcione. Além das vozes femininas, a cantora inclui no seu set list Cartola, Nelson Cavaquinho, Ataulfo Alves, Adoniran Barbosa e João Nogueira. Nomes que ela conheceu ainda criança, nos saraus promovidos na casa de seu pai, Esmeraldo Garcia.  

Alegria melancólica do samba numa interpretação marcante. Foto: Samba Artesanal

O Samba Artesanal começou a maratona de lives no final de março. Elas acontecem todas as quartas, sextas e domingos, sempre às 21h. Para Pablo, as transmissões virtuais chancelam a proposta de resgate e salvaguarda de sambas épicos, mas com acordes inusitados, similares às improvisações trazidas pelo blues e jazz americanos. Tudo isso numa poética elaborada artesanalmente, bem ao gosto da brasilidade.   

Fernanda é maranhense da capital São Luís. A mistura de ritmos do estado e a influência do pai ajudaram a formar a cantora que gravou seu primeiro EP em 2014. Já em 2018, ela se mudou para o Rio e conheceu Pablo. Três meses depois, veio o casório. Pablo é carioca da Lapa, bairro boêmio que ambienta o Circo Voador, casa de shows ao lado dos famosos Arcos. 

Embora não tenha cursado faculdade de música, Pablo é celebrado pelo dedilhar que mistura clássico e popular nas cordas do violão e do cavaquinho. A inspiração musical do violonista é eclética. Passeia pelas orquestras russas, flautas de pífano do Pernambuco e, além do samba, por outra paixão, os ritmos latinos como rumba, salsa e merengue. Esse cadinho perpassa a interpretação do artista quando pega o violão. 

Enquanto o futuro do entretenimento continua incerto pela pandemia e pela incapacidade do Governo Federal estabelecer uma política mais adequada aos artistas, Fernanda e Pablo seguem com as lives não só como fonte de renda pela colaboração dos internautas, mas como forma de se manterem ativos e numa relação mediatizada com o público. 

O Samba Artesanal foi criado em julho de 2018. Além do duo formado por Fernanda e Pablo que apresentam as lives, há também a modalidade de trio, que inclui a percuteria (mistura de percussão e bateria). Outra formação é Fernanda Garcia & Grupo Cuíca de Goela (cavaquinho, violão, pandeiro, surdo e, esporadicamente, o naipe de metais).   

Redação Douglas

*É jornalista, mestre em Letras e professor de redação no curso SOU1000. (Imagem logo Sou1000)

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