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ARTIGO: O QUE É PRECISO PARA RESGATAR A VERDADEIRA TIRADENTES?

Foto: arquivo pessoal

Joyce H. S. Tanus *

Eu cresci no bairro conhecido como Cascalho, na cidade de Tiradentes. Tive uma infância muito feliz e lembro o quanto a cidade era divertida. Durante todo o mês de junho, eu e boa parte das crianças do bairro ensaiávamos a quadrilha com ansiedade para a grande e esperada Festa Julina do Cascalho.

Naquela época, íamos de porta em porta coletar doações para realizarmos a canjica e o caldo de forma gratuita durante o evento. Lembro que era assim em quase todos os bairros – como o da Torre, Cuiabá, Pacu e Santíssima Trindade. A cidade tinha vida. Os bairros se comunicavam e convidavam às quadrilhas dos outros para se apresentar.

Aos poucos a cidade foi mudando… muitos bairros deixaram de fazer suas tradicionais festas e venho a muito tempo me perguntando o porquê.

Acredito que a resposta esteja no processo de gentrificação que Tiradentes tem passado já há alguns anos. Houve um deslocamento das famílias de classe baixa dos bairros centrais para bairros mais periféricos, e até mesmo para outras cidades da região das Vertentes.

Essas mudanças, muitas vezes, se deram por especulação imobiliária e dificuldade em manter uma qualidade de vida no local. Consequentemente, várias dessas festas foram desaparecendo: seja porque os moradores dos bairros passaram ser outros, seja porque essas festas foram deixadas de lado em favor de festivais destinados para os turistas.

Esse processo de gentrificação também pode ser percebido na economia. Estabelecimentos comerciais – como lojas, restaurantes e pousadas – são, em sua maioria, de proprietários que não são nativos ou moradores da cidade. O público-alvo desses estabelecimentos, por sua vez, são turistas: o que de forma significativa impacta nos preços dos produtos e serviços.

Este cenário contribui ainda mais para exclusão do tiradentino de sua própria cidade, já que os preços praticados impedem que ele frequente esses espaços. Quem é da cidade passou a preferir fazer suas compras e passar seus momentos de lazer nas cidades vizinhas, que são mais acessíveis.

Isso tudo contribui para que a cidade se torne quase dependente – de forma exclusiva – do movimento turístico. E essa fragilidade pode ser vista no atual momento de crise sanitária e financeira. A falta de circulação de turistas coloca em risco toda a economia da cidade.

Tiradentes tem os recursos e a demanda para oferecer também serviços mais acessíveis para seus habitantes, se tornando mais autossustentável. Da mesma forma, o município também é capaz de conciliar as festas tradicionais de seu povo com os novos festivais do calendário turístico.

Esse momento de pandemia, apesar de delicado, nos oferece a oportunidade de repensar o futuro da cidade.

O que falta para resgatar a verdadeira Tiradentes? A vontade das administrações públicas, dos empresários e do povo.

* É estudante de Comunicação Social – Jornalismo na Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ).

Os artigos de opinião e colunas publicados não refletem necessariamente a opinião do portal Notícias Gerais

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