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“MUITOS FAZEM UMA SUPEREXPOSIÇÃO RIDÍCULA”, AFIRMA ESPECIALISTA EM CAMPANHAS SOBRE LIVES DE POLÍTICOS

Foto: arquivo pessoal

Arthur Raposo Gomes
Notícias Gerais

Faltam algumas semanas para o início oficial da corrida eleitoral: os partidos podem realizar o registro das candidaturas até o dia 26 de setembro e, a partir do dia seguinte, será permitido o início da propaganda eleitoral. Por causa disso, o Notícias Gerais conversou com Luiz Penna, que tem experiência com campanhas políticas.

Durante a entrevista, ele revela um pouco da sua trajetória no meio eleitoral; comenta sobre a vitória do presidente Jair Bolsonaro no pleito de 2018, marcada pelo intenso uso das mídias sociais; e dá dicas estratégicas aos pré-candidatos de 2020.

Confira!

Notícias Gerais (NG) – Você já trabalhou em campanhas políticas eleitorais? Quantas?

Luiz Penna (LP) – Sim. Atuei em muitas campanhas políticas. O meu envolvimento nesta área começou na década de 80, quando trabalhei na região da Zona da Mata mineira como um dos coordenadores da campanha do candidato a deputado federal Luiz Dulci (PT), um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores, e que posteriormente se tornou secretário-geral da Presidência da República no Governo Lula. Em 1992, fui assessor de comunicação e estrategista do candidato a prefeito em Barbacena, Fred Ayres (PSB). Quando Ayres se candidatou a deputado estadual, em 1994, fui novamente convidado para atuar na sua campanha; neste mesmo ano, trabalhei como coordenador regional, no segundo turno, na eleição do candidato ao governo de Minas Gerais Hélio Costa. No início de 2000, comecei a assessorar o deputado estadual Antônio Carlos Andrada, que foi presidente do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais e atualmente é pré-candidato a prefeito em Barbacena. Também trabalhei com o deputado estadual Lafayette Andrada por um bom tempo. De 2003 a 2007, atuei em muitas prefeituras das regiões do Campo das Vertentes e da Zona da Mata como estrategista político. Em 2010, me candidatei a deputado federal pelo Partido Verde.

NG – Em 2018, a campanha vitoriosa do presidente Jair Bolsonaro já contou com muitos recursos de comunicação on-line. Em TV, por exemplo, ele tinha poucos segundos, mas mesmo assim, foi eleito.

LP – Exato. Jair Bolsonaro pegou carona no movimento das novas transformações surgidas pelos algoritmos, numa época que o quarto poder, com suas mídias convencionais (rádios, jornais, televisão aberta) começam a perder espaço para o quinto poder (blogs, YouTube, WhatsApp, Twitter, Facebook e sites com notícias independentes). E nada disso veio por acaso, principalmente na política. Passa pela primeira vitória de Barack Obama em 2008; pelo movimento Brexit em 2016, quando o Reino Unido através de um referendo popular vota a favor de sua saída da União Europeia; e pela ultradireita italiana que ensinou o mundo a usar as Fake News. Obviamente, a Cambridge Analytica, com Robert Mercer, usaram e abusaram dos algoritmos para criar ações geopolíticas diferentes dos modelos analógicos. Bolsonaro não está sozinho nesta história. O seu filho Eduardo Bolsonaro e o escritor Olavo de Carvalho, iniciaram uma parceria profunda com ideólogos e especialistas em comunicação de massa dos Estados Unidos, para provocar a confusão.

NG – Em 2020, acredita que a internet vai ser essencial para uma boa campanha? Ou mesmo durante uma pandemia de Covid-19, ainda é preciso uma estratégica agenda física?

LP – A internet, sem dúvida, terá uma grande participação nesta história. Porém, assim como foi detectado pelo inglês, Dominic Cummings, principal estrategista de campanha do Brixit, há muita gente que vive fora da bolha semiótica criada pela internet. Esta foi uma de suas sacadas para poder ter os votos que precisava, através do corpo a corpo e do mapeamento dos excluídos. Algo que terá que ser bem analisado pelos atuais pré-candidatos a prefeito.

NG – O atual governador de Minas Gerais, Romeu Zema (NOVO), foi um caso que surpreendeu e, mesmo sem muito espaço no Horário de Propaganda Gratuita Eleitoral (HPGE) e sem participar de muitos debates, chegou ao segundo turno e venceu nomes conhecidos – como o do senador Antônio Anastasia e o então candidato à reeleição Fernando Pimentel. Geraldo Alckmin tinha muito espaço na TV, mas sua candidatura à presidência também não “vingou”.
A TV vem perdendo força na hora da campanha? Ou esses são casos excepcionais? Considera que, em 2020, com as pessoas em casa, a TV volte a se tornar uma mídia fundamental?


LP – Os casos de Romeu Zema, de José Witzel, governador do Rio de Janeiro, e de João Dória, governador de São Paulo, são semelhantes. Os estrategistas, inspirados na dinâmicas políticas criadas pela ultradireita italiana, induziram as pessoas que o “tradicional” não tinha as respostas certas para resolver os problemas sociais, e era preciso mudar a roupagem com a ideia de uma nova visão de gestores públicos que, em tese, não tinham os vícios dos partidos políticos com suas oligarquias. O mesmo acontece com a mídia convencional. Ela perdeu o espaço de barganha. Está desorientada pois sabe que seu modelo já não funciona mais. A tendência será o seu fim. A linguagem, as pautas das matérias, o excesso de cristandade e o seu binarismo, estão ultrapassados. Com certeza a eleição de 2020 será extremamente fragmentada, e caótica, mas o candidato que conseguir ser plural nas linguagens das redes sociais, terá um bom desempenho. O gestual e a fala ainda são poderosos instrumentos.

NG – Tem alguma mídia social que considera de “suma importância” para um candidato? Ou todas são importantes na hora de chamar atenção do eleitor? Ou esse fator é variável?

LP – Eu creio que o YouTube, o Instagram, o Facebook, o blog, o Twitter e o WhatsApp são essenciais. Quem souber trabalhar nestas plataformas, conseguirá uma resposta positiva.

NG – Em tempos de superexposição nas mídias sociais, acha que os candidatos vão precisar “entrar em um BBB (Big Brother Brasil)” de tanto fazer lives?

LP – Houve uma época que o marqueteiro Chico Santa Rita trabalhava com modelos psicológicos do “super-político”, com elementos mitológicos de poderes “sobrenaturais”, com a imagem e semelhança de um Bonaparte, de um Stalin, de um Hitler e de um Mussolini, obviamente com roupagens modernas, mas todos seguiram a risca essa ideia de serem legitimados por forças não naturais. Quantos prefeitos, deputados e senadores, ao longo dos anos, passaram por esta escola? Muitos. Duda Mendonça, por exemplo, criou uma narrativa “pai dos excluídos”, para que Lula ganhasse espaço no imaginário coletivo, como se ele fosse a encarnação de Getúlio Vargas. Todo o gestual, as imagens programadas para estampar as capas das revistas e jornais, iam nesta direção: do salvador da pátria. No momento, como tudo mudou de configuração por causa da crise do Covid-19, há uma certa corrida maluca por parte de candidatos que ainda não entenderam com profundidade o que está acontecendo. Muitos fazem uma superexposição que acaba sendo ridícula. Há uma diferença do brasileiro Jair Bolsonaro, do americano Donald Trump, do inglês Boris Johnson e do italiano Matteo Salvini. Esses caras, apesar da superexposição, das esquisitices que comentam no dia-a-dia, com suas “gafes” bem construídas, fazem parte de um jogo que está fora do radar da grande mídia, que por sua vez é manipulada por um capital que dita as regras do jogo.

NG – Qual a sua opinião sobre estratégias “tradicionais” como carreatas e carro de som? Serão importantes em um pleito onde as pessoas são orientadas a ficar em casa por causa da pandemia de Covid-19?

LP – Tudo mudou de configuração. As pessoas estão amedrontadas, com medo da morte… numa cultura que baniu esta palavra do dia-a-dia e que, agora, começa a perceber o quanto somos frágeis. Ninguém é super-herói. Decerto, há muitos que teimam em negar este fato, mas a realidade tem apresentado outros dados. A cultura da negação, de contrapor as transformações físicas e biológicas do planeta, é um ato de desespero. Todos tentam validar o utilitarismo como forma de sobreviver a caos que estamos metidos. E os candidatos, neste pleito eleitoral de 2020, terão que estar conectados com as novas demandas sociais, que passam pela reestruturação da civilização. Eles terão que pensar o futuro com “F” maiúsculo. De certa forma, este raciocínio também deve estar intimamente ligado com a questão da campanha eleitoral. Novas linguagens, com conteúdo e argumentos sinceros, terão uma grande força neste período. No fundo as pessoas estão impacientes com ruídos. Queira ou não. O inconsciente coletivo passa por uma revolução neurolinguística. Carreatas e carros de som só produzem muito barulho por nada. Atualmente há novas maneiras de se produzir bolhas semióticas com impactos mais positivos.

NG – Em tempos de infecção pelo novo coronavírus, acredita que é o fim do santinho de papel? Ou ele ainda tem o seu lugar?

LP – Acabou o santinho. Assim, como no passado a luz elétrica substituiu a vela, o mesmo acontece no presente. Santinho, programa de governo, tudo será gerado pelo pdf e esparramado pelas redes sociais. Definitivamente o santinho perdeu seu espaço. 

NG – Por fim, qual dica você dá para os pré-candidatos de 2020?

LP – Que estejam preparados. Principalmente na questão ambiental. Terão que ter sensibilidade, visão de mundo, e (habilidade para) configurar novos conceitos sobre a realidade atual. Estamos na era quântica. Na era dos algoritmos, onde o marqueteiro perde espaço para físicos e matemáticos. Definitivamente o universo não é tão mecânico e harmônico como acredita Isac Newton: ele é caótico, assimétrico e poeticamente imperfeito, assim como é a política neste início de século.

Foto: arquivo pessoal

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