Wanderson Nascimento
Notícias Gerais
Uma semana após o Governo de Minas anunciar o fechamento de um acordo para reparação do crime ambiental do Córrego do Feijão, que deixou 272 mortos em Brumadinho, em janeiro de 2019, quatro organizações vão entrar com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) pedindo a suspensão da homologação do acordo, que teve o valor estipulado de R$ 37,68 bilhões.
Trata-se de uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), que requer também a manutenção do pagamento do auxílio emergencial às famílias enquanto durar o procedimento de consulta prévia, livre e informada das comunidades. O número estimado de pessoas que ficaram fora do acordo celebrado na última semana, sem direito a receber a renda mínima, é de 20 mil atingidos.
A ADPF é assinada pela Associação Nacional dos Atingidos por Barragens (ANAB), o Centro de Alternativas Socioeconômicas do Cerrado (Casec) e os partidos PSOL e PT.
Em coletiva de imprensa realizada por videoconferência na tarde desta quarta-feira (10), os signatário e outras entidades envolvidas na iniciativa explicaram mais sobre a ação que será movida no STF. De acordo com Maria Julia Zanon, da coordenação nacional do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), é preciso reabrir as discussões para melhorar o acordo, com a participação efetiva dos atingidos.
“A população, que vive o dia-a-dia dessa tragédia há dois anos, não foi ouvida. Os moradores da Bacia do Paraopeba está vivendo um novo luto, pois as formas como aconteceram as coisas foram terríveis para as populações atingidas. Uma das obras, o rodoanel, irá beneficiar grandes empresas, inclusive a própria Vale, facilitando o escoamento da produção da empresa; não os atingidos”, declara.
“Uma das obras, o rodoanel, irá beneficiar grandes empresas, inclusive a própria Vale, facilitando o escoamento da produção da empresa; não os atingidos”
Maria Julia Zanon, da coordenação nacional do MAM
Joceli Andrioli, da coordenação nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), também destaca que os atingidos não tiveram direito à participação e, na avaliação da entidade, foram “passados para trás”. “Eles tiveram prejuízo, pois os valores estabelecidos no acordo são muito inferiores aos solicitados. O valor não dá conta de atender às comunidades atingidas. O governo ganha muito com grandes obras e os atingidos não são reparados justamente. É direito da população não passar fome até a reparação definitiva”, explica, destacando também que cerca de 100 mil pessoas atingidas de alguma forma estão excluídas do acordo.
O governo ganha muito com grandes obras e os atingidos não são reparados justamente. É direito da população não passar fome até a reparação definitiva”
Joceli Andrioli, da coordenação nacional do MAB
Somente R$ 7,4 bilhões dos mais de R$ 37 bilhões do acordo serão direcionados à população atingida. São R$ 4,4 bilhões de pagamento de renda às famílias e R$ 3 bilhões a um fundo que vai financiar projetos de emprego e renda para essa população.
Leandro Gaspar Scalabrin, representando a ANAB, declarou que o acordo foi feito essencialmente entre os responsáveis pela tragédia, não entre os atingidos, e beneficia os responsáveis pelo crime, não as vítimas. “Esperamos que o STF nos dê condições de reestabelecer o acordo e a justiça. Caso à justiça brasileira não se mostrà altura de garantir o direito de participação dos atingidos, teremos que recorrer a órgãos internacionais”, declara.
Scalabrin explica que a ação se fundamenta em alguns preceitos. Entre eles, no fato de o acordo ter sido feito sem autorização da ALMG; ter recebido cláusula de confidencialidade, mesmo envolvendo o poder público e sem respeitar direito dos dos atingidos, previsto na Constituição, de participação livre, prévia e informada nos processos de negociação do acordo.
Ainda participaram da coletiva Raquel Monteath, representando a Centro de Alternativas Socioeconômicas do Cerrado CASEC; a deputada federal Áurea Carolina, do PSOL/MG, membro da comissão externa do acordo em Brasília e o deputado federal Rogério Correia, do PT/MG, membro da comissão externa do acordo em Brasília.
Estado se reuniu com comunidade
Representantes do Governo de Minas e da Defensoria Pública se reuniram em Brumadinho, no último sábado (06), dois dias após a assinatura do acordo, com integrantes das comunidades atingidas pelo rompimento da Barragem Mina Córrego do Feijão, em janeiro de 2019. No encontro, além do detalhamento do Termo de Medidas de Reparação firmado entre o Poder Público e a mineradora Vale, foram discutidos os próximos passos do processo para reparar os danos causados pela tragédia. Entre eles, a construção, de forma conjunta, dos mecanismos de participação dos atingidos na escolha dos projetos prioritários para o município e região e também nas etapas de discussão que serão percorridas para a definição de critérios para o Programa de Transferência de Renda, que é a solução definitiva para o auxílio emergencial. Estes próximos passos contarão com o apoio da Defensoria Pública, dos Ministérios Públicos e das Assessorias Técnicas Independentes.