Najla Passos e Kamila Amaral
Notícias Gerais
O presidente Jair Bolsonaro tem recebido críticas dos cientistas e técnicos em saúde do país ao defender o fim do isolamento social, contrariando a posição do próprio Ministério da Saúde. Na região de São João del-Rei, a mesma postura vem sendo abraçada pelo deputado federal Frederico de Castro Escaleira, o Dr. Frederico, filiado ao Patriota. E tem causado polêmica.
Presidente do Consórcio Intermunicipal de Saúde da Vertentes (CISVER), o prefeito de Barroso, Reinaldo Fonseca, critica a postura de ambos. “A posição do presidente Jair Bolsonaro vem insuflando os comerciantes, a população, inclusive contra os prefeitos, que adotaram o isolamento justamente para protegê-los. Ele, como comandante maior da nação, precisa ter seu discurso afinado com o do ministro da Saúde”, afirmou.
Fonseca afirma que os números mostram que a quarentena já diminuiu a taxa de crescimento da curva da doença em Barroso. E defende que, ainda que o isolamento total tenha sido um excesso, agora não é possível voltar atrás, pois aproxima-se o momento de pico da contaminação. “Se nós sairmos do isolamento com atropelo, vamos virar a Itália, a Espanha ou Nova York. A experiência de outros lugares comprova que o isolamento total ainda é o mais recomendado”, defendeu.
O prefeito avalia, da mesma forma, que Dr. Frederico não ajudou na conscientização da população sobre a gravidade do momento ao propor o fim do isolamento total. “Ele tentou amenizar o discurso inflamado de Bolsonaro, mas acabou colocando mais lenha na fogueira. Ele é um formador de opinião, é um médico. Está na hora de unir informações, unir discursos e respeitar o que preconiza o Ministério da Saúde”, opinou.
Se nós sairmos do isolamento com atropelo, vamos virar a Itália, a Espanha ou Nova York. A experiência de outros lugares comprova que o isolamento total ainda é o mais recomendado”
Isolamento social e higiene
A enfermeira-chefe do Setor de Epidemiologias da Secretaria de Saúde de São João del-Rei, Eliene Freitas, reforça que as medidas de isolamento social adotadas são necessárias para que o sistema de saúde consiga suprir a demanda. “ A gente precisa do comprometimento de todo mundo para que o resultado seja ainda mais efetivo. Isolamento social e medidas de higiene são, indiscutivelmente, os pilares de sustentação para que o sistema de saúde não entre em colapso” afirma.
Freitas considera preocupante o modo como parte da população tem encarado a relação entre o vírus, os grupos de risco e o restante do público. “Eu particularmente me preocupo com essa interpretação de que: para eles é ruim, pra eles não pode e eu posso”, relata a enfermeira.
Outra preocupação do momento é seguir com as recomendações do Ministério da Saúde. “Temos a circulação do vírus e temos que tomar cuidado. Não é momento de serenidade, precisamos manter a vigilância e acompanhar” disse. Para ela, essa é a hora de pecar pelo excesso. “Nosso posicionamento é de cuidar mais e orientar a população a manter as medidas de segurança necessárias”, conclui.
“Isolamento social e medidas de higiene são, indiscutivelmente, os pilares de sustentação para que o sistema de saúde não entre em colapso”
Eliene Freitas, enfermeira-chefe do Setor de Epidemiologias
da Secretaria de Saúde de São João del-Rei
Maior nível de isolamento possível
O reitor da UFSJ, Sérgio da Gama Cerqueira, salienta que, uma vez que não é profissional da área de saúde, seu papel é ouvir os especialistas no assunto. “E o que os pesquisadores e cientistas dizem é que é importante manter o maior nível de isolamento possível”, afirma. Cerqueira lembra que a defesa do isolamento vertical não foi bem aceita pela comunidade científica.
Ele pontua ainda que a UFSJ, seguindo as recomendações do órgãos de saúde, vem adotando medidas para garantir a segurança de alunos e funcionários, como a suspensão das aulas e a adoção do modelo de teletrabalho, onde os servidores atuam de casa.
Como ações voltadas para a comunidade externa, o reitor lista a produção de álcool gel para distribuição e afirma que a universidade vem adotando diversas outras ações pontuais de auxílio. Além disso, ele ressalta o trabalho dos servidores e de alguns alunos da área da saúde que estão mantendo suas atividades durante a crise.
Sobre o debate sobre o impacto do isolamento social de toda população na economia, o reitor enfatiza que a prioridade deve ser a manutenção da vida. “Se eu tenho uma crítica à forma como o governo vem lidando com a crise é a falta de políticas públicas para garantir que os trabalhadores possam ficar em casa sem preocupação”, finaliza.
“o que os pesquisadores e cientistas dizem é que É importante manter o maior nível de isolamento possível”
Doença altamente infecciosa
Médico, professor da Faculdade de Medicina da UFSJ e ex-secretário de Saúde de São João del-Rei, Rodrigo Chaves Penha, destaca que o isolamento visa impedir que uma doença altamente infecciosa se alastre pela população, de forma a proteger pessoas mais que possam desenvolver a forma mais grave da doença e principalmente da morte.
“É um agente altamente transmissível, com um quadro leve que pode não ser reconhecido, mas que pode rapidamente exigir muitos recursos de saúde e matar susceptíveis por ação direta ou aqueles que não conseguirem auxílio para outras condições que levem à morte”, afirma.
Em artigo publicado nesta segunda pelo Notícias Gerais, ele avalia as duas formas possíveis de isolamento, o vertical e o horizontal, e defende o segundo como melhor forma de contenção do contágio.
“Temos algumas situações em que o isolamento vertical foi adotado, com destaque para Milão, na Itália, e para a Inglaterra. Em ambos os casos, por aumento do número de casos e mortes em um curto intervalo de tempo, houve a mudança da recomendação para o isolamento horizontal”, exemplificou.
“Temos algumas situações em que o isolamento vertical foi adotado, com destaque para Milão, na Itália, e para a Inglaterra. Em ambos os casos, por aumento do número de casos e mortes em um curto intervalo de tempo, houve a mudança da recomendação para o isolamento horizontal”
Entenda o caso do Dr. Frederico
Em vídeo divulgado
nas redes sociais na última sexta (27), Dr. Frederico, que é médico, defendeu o
chamado isolamento vertical, em que só idosos e pessoas do grupo de risco permanecem
em isolamento. Dentre os motivos apontados, o deputado federal cita o caos econômico
que o isolamento completo poderá ocasionar. Foi duramente criticado.
“Ao propor o isolamento
vertical, eu não estou menosprezando a pandemia do coronavírus. Estamos diante
de um problema grave. E, como médico, estudando o tema, entendo que o
isolamento horizontal (para todos), além dos 15 dias iniciais, não nos trará
maiores benefícios. Primeiro porque, a cada dia, teremos mais avanços nas
possibilidades de prevenção e tratamento da Covid-19. E segundo, precisamos
evitar um colapso econômico, que nos enfraquecerá no combate ao vírus, além de
nos colocar em um cenário de caos sem precedentes”, justificou, na sua conta no
Facebook.
No domingo, Dr. Frederico emitiu um comunicado reafirmando sua posição e pedindo mais união e menos ódio àqueles que o criticaram. “Se a minha tentativa de contribuir gerou ÓDIO, neste momento em que a UNIÃO é fundamental, percebi que preciso rever algumas questões. Minha opinião, eu mantenho e, apesar de não ser majoritária, ela não é isolada. Alguns outros médicos também apontam esse caminho. (…) Por outro lado, evitarei as polêmicas no debate público sobre o coronavírus. Irei ajudar a divulgar as recomendações do nosso Ministério da Saúde e peço para que as pessoas as cumpram”, afirmou.