Ana Laura Queiroz e Najla Passos
Notícias Gerais
Os eleitores decidiram reforçar a participação feminina na Câmara de São João del-Rei, ampliando de uma para três o número de vereadoras mulheres eleitas. Agora, entretanto, um outro fator ameaça o desempenho das mulheres no legislativo da cidade. O principal pré-candidato à presidência da Casa, o vereador reeleito Stefanio Pires (PSL), foi condenado por violência doméstica.
A condenação ocorreu em novembro de 2018, mas, só agora, a Justiça retirou o processo do segredo de justiça, que o manteve desconhecido do público. Stefanio, de 51 anos, foi condenado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais por lesão corporal, enquadrado na Lei Maria da Pena. A Justiça considerou verídica a acusação de que ele teria agredido a esposa e a enteada, em 2013.
Apesar da gravidade do ocorrido e da natureza criminal, os direitos políticos do vereador foram amplamente mantidos e o réu segue para seu terceiro mandato na Casa Legislativa são-joanense, reeleito com 1.207 votos. A pena imposta a ele foi de apenas três meses de detenção, em regime aberto.
Violência contra a mulher
De acordo com a sentença, a violência doméstica ocorreu no dia 24 de dezembro de 2013 e Stefanio Pires se encontrava bêbado. As agressões foram motivadas por ciúmes.
“O denunciado (Stefanio) agrediu a vítima […] desferindo-lhe socos, tapas, chutes e empurrões, causando-lhe lesões corporais. […] Consta ainda que, na mesma oportunidade, o denunciado também agrediu a vítima […] sua enteada sem, contudo, causar-lhe lesões corporais”
Segundo a sentença, as primeiras agressões foram de tamanha intensidade que resultaram na quebra da cama onde a esposa se encontrava. Stefanio ainda a empurrou a contra a parede e a atingiu com mais chutes. Ao tentar ajudar a mãe, a enteada do réu também foi vítima de agressão, mas conseguiu desviar dos socos, saindo ilesa fisicamente.
Quem cala consente?
O Notícias Gerais procurou as três mulheres eleitas neste ano para saber o que elas acham da possibilidade de ter que cumprirem seu mandado ao lado de um colega violento contra mulheres.
A vereadora reeleita Lívia Guimarães (PT), que já sofreu um ataque machista de Stefanio, afirma que a possibilidade de ter um presidente da Câmara condenado por violência doméstica é um reflexo da falta de mulheres nos espaços políticos. Para ela, caso tal situação se concretize, trará dificuldades para a inserção de pautas que tratam da violência de gênero.
“Os espaços políticos tendem a ser ocupados em sua maioria por homens […]. Acredito que ter um presidente machista não muda a forma como as mulheres fazem política, mas amplia a dificuldade em pautar projetos de leis e ações que possam beneficiar nossa população.” comenta.
Já Rosinha do Moto Taxi (PSL), eleita com 1.287 votos, pela mesma legenda que Stafanio, não respondeu à solicitação de entrevista da equipe do Notícias Gerais. Pelo histórico de fidelidade ao partido, a expectativa é que ela, apesar de mulher, vote favorável à eleição do presidente machista.
Já o voto de Mara Protetora de Animais (PSC), eleita com 609 votos, permanece uma incógnita. O partido dela apoia historicamente o prefeito e ela já foi vista no sítio dele, em Tiradentes, negociando apoio político. Mas há quem acredite que o compromisso com a integridade das mulheres falará mais alto. Ela também não atendeu a solicitação de entrevista do NG.
A oposição nas ruas
Para Janaine Ferreira, candidata derrotada à prefeitura de São João del-Rei pelo PSTU nesta corrida eleitoral de 2020, ter um presidente machista na Câmara é inaceitável. “Nós não podemos admitir que a presidência da Câmara do nosso município seja ocupada por um indivíduo machista e que chegou a esse extremo de violência contra uma mulher. Isso é inadmissível.” compartilha.
Ela enfatiza, ainda, que os vereadores que votarem a favor de Stefanio estarão, também, se comprometendo com atitudes machistas e de desrespeito às mulheres.
Violência de gênero em MG
Segundo a Polícia Civil de Minas Gerais, entre 2018 e 2020, um total de 252.373 mulheres foram vítimas de violência doméstica e familiar. Entre janeiro de 2018 e julho de 2020, foram 1.011 vítimas de feminicídio no estado. Somente neste ano, 82.250 mulheres residentes em Minas Gerais foram vítimas de violência doméstica.
Já no Brasil, segundo o Atlas da Violência 2020, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), uma mulher é assassinada a cada duas horas.
Lei da Ficha Limpa
Até o momento, a Lei Ficha Limpa não inclui condenações por violência da natureza tratada nesta matéria.
Em âmbito municipal, foi sancionada em agosto deste ano a Lei Municipal nº 5.686, de autoria da vereadora Lívia Guimarães (PT), que veda a nomeação para cargos de confiança de pessoas que tenham sido condenadas pela Lei Maria da Penha.
Entretanto, não há nada que impeça a candidatura para o legislativo ou executivo de condenados por crimes de violência contra a mulher.
A reportagem do Notícias Gerais tentou ouvir o vereador Stefanio Pires desde a última quarta (2), mas até o fechamento desta edição ele não atendeu à solicitação de entrevista.
O portal segue disponível a ouvir todos os citados. Caso ocorra um posicionamento, será adicionado.