Redação
Notícias Gerais
Uma entrevista da superintendente de Alimentação Escolar da Prefeitura de São João del-Rei, Sílvia Fernanda de Almeida, à página Pop News, está repercutindo de maneira negativa entre moradores da cidade.
A ideia da entrevista era que Silvia falasse sobre uma questão referente a distribuição de kits de merenda escolar. Durante conversa com o superintendente de Comunicação do Gabinete do Executivo, Tovar Luiz da Silva, então, ela declarou que a merenda é apenas um complemento para o aluno.
“A alimentação escolar tem que ser responsável por 30% das necessidades nutricionais dos estudantes”, citou.
Em outro momento, Silvia também ressaltou que é preciso que se descaracterize a ideia de que a merenda escolar é uma ajuda para a família.
“O governo não tem obrigação nenhuma de alimentar a família. Os kits são calculados pelas nutricionistas de acordo com as necessidades dos alunos. O governo oferece aos estudantes 30%, os outros 70% cabem aos pais que geraram esses filhos”, pontuou.
Sílvia defendeu ainda que o governo faz isso, gratuitamente, por causa das grandes desigualdades sociais que existem no país, com muitos estudantes com carência nutricional, proveniente da incapacidade das famílias de suprir suas necessidades.
No entanto, foi uma frase dita por Silvia, aparentemente em resposta a um episódio específico, que chamou a atenção de quem assistiu ao vídeo.
“Aparece uma mãe reclamando que não tem milho verde… Não tem milho verde, não tem lagosta, não tem camarão, não tem caviar. O que existe no kit é a necessidade de 30% de acordo com a faixa etária dos alunos”, afirmou Silvia.
Confira o vídeo:
Repercussão negativa
A fala da superintendente de alimentação escolar repercutiu negativamente entre os internautas que visualizaram a gravação: mais de 350 comentários foram feitos no post da entrevista. Confira alguns:
- “Avisa esse ser discrepante que nada é dado não, pagamos impostos para serem revertido em educação e saúde. E esses kits estão sendo dados para não estragarem, para não ser mais um agravante nas costas do Sr. Prefeito!”.
- “É um complemento pra quem já tem comida em casa, mas o que vocês não enxergam é que para muitas famílias essa é a única fonte de alimentação, mas isso não tem como vocês saberem pois é muito longe de suas realidades, muito triste ver pessoas que deveriam ajudar, com cargos políticos importantíssimos falando uma coisa dessas.”
- “Que Deus te abençoe que nunca falte uma lagosta em sua vida! Já parou pra pensar que existem várias famílias carentes que esse kit possa ser o único alimento a entrar na mesa? Seja mais humilde e menos arrogante! Por que o mundo é redondo! Ele dá voltas!”
Direito à alimentação escolar
Em entrevista ao Notícias Gerais, a nutricionista Regina Oliveira afirma que o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) é um dos maiores do mundo e relembra que o programa passou a ser uma política nacional em 2009.
“Infelizmente a gente ainda vê algumas pessoas que desconhecem a importância desse programa, que é muito mais do que oferecer uma comidinha, uma merenda”
– frisa Regina Oliveira.
Regina, que atualmente é diretora do Conselho Regional de Nutricionistas de Minas Gerais (CRN9) e coordenadora da Câmara Técnica de Saúde Coletiva desta entidade, também reitera que o PNAE “é um programa realizador de direitos, e a alimentação escolar é um direito previsto em diversas leis, incluindo a Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente”.
Dever dos gestores
Regina comenta que cabe, a todos os gestores, fazer com que essa política pública seja cumprida de forma plena. “É inaceitável quando a gente escuta alguns gestores ou gestoras falando de forma irônica de um programa que tem uma importância tão grande. Principalmente no momento em que o país vive, quando o Brasil voltou para o mapa da fome. Nesta pandemia temos visto diversas pessoas passando fome”, lamenta.
Ela confirma que, realmente, esses recursos repassados pelo governo federal por meio do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) são destinados para a alimentação de estudante, no entanto, os familiares também têm o direito a uma alimentação, conforme previsto na Constituição Federal.
“Cabe ao poder público garantir esse direito, com toda a dignidade que todos os seres humanos são merecedores”, afirma.
Alimentação de qualidade é um direito
A nutricionista ainda destaca a importância do PNAE no que se refere as garantias da qualidade da alimentação. segundo Regina, em 2018, o governo federal sancionou um lei que determina que ações de educação alimentar e nutricional sejam realizadas nas escolas, o que é também um dever do poder público, na intenção de obter-se uma alimentação escolar muito mais saudável.
“Quando um alimento vai ser oferecido na escola, é preciso pensar se ele é adequado do ponto de vista nutricional, adequado à cultura alimentar da região e ainda tem que ser adequado ao que está previsto na resolução. Então não se oferece qualquer produto”
– sinaliza Regina Oliveira, nutricionista e diretora do CRN9.
“É importante entender que a alimentação é um direito de todos, os escolares e seus familiares. Esse direito deve ser garantido, e nós devemos utilizar de todos os mecanismos, inclusive judiciais, para garantir que esse direito seja cumprido”, emenda.
Ela conclui dizendo que ironizar um programa dessa importância não é o que a sociedade espera de um gestor, que deve se pautar dentro daquilo que preconiza toda a legislação para a administração pública.
O que é o PNAE
O Programa Nacional de Alimentação Escolar oferece alimentação escolar e ações de educação alimentar e nutricional a estudantes de todas as etapas da educação básica pública.
O governo federal repassa – a estados, municípios e instituições federais de ensino – valores financeiros para a cobertura de 200 dias letivos, conforme o número de matriculados em cada rede de ensino.
O PNAE é acompanhado e fiscalizado diretamente pela sociedade, por meio dos Conselhos de Alimentação Escolar (CAE) e também pelo FNDE, pelo Tribunal de Contas da União (TCU), pela Controladoria Geral da União (CGU) e pelo Ministério Público.
Com a Lei nº 11.947, de 16/6/2009, 30% do valor repassado pelo Programa Nacional de Alimentação Escolar – PNAE deve ser investido na compra direta de produtos da agricultura familiar, medida que estimula o desenvolvimento econômico e sustentável das comunidades.
A Lei nº 13.987, de 7 de abril de 2020, autorizou, em caráter excepcional, durante o período de suspensão das aulas em razão de situação de emergência ou calamidade pública, a distribuição de gêneros alimentícios adquiridos com recursos do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) aos pais ou responsáveis dos estudantes das escolas públicas de educação básica.
De acordo com o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), a oferta de alimentação escolar deve suprir de 20 a 70% das necessidades dos alunos, de acordo com o tipo de ensino. Por exemplo, em creches de período parcial, a quantidade é de 30%; já instituições que funcionam em período integral, essa quantia aumenta para 70%, com três refeições. Na educação básica, essa quantia é de 20 a 30%.