Najla Passos
Da Editoria
Rafaell Donaldson Vale Ferreira, o Breds, como é conhecido pelos amigos, enfrentou 20 horas de ônibus para passar seu aniversário de 34 anos com a família. Vendedor de roupas e de ferramentas para a construção civil, ele estava em Vitória da Conquista, na Bahia, fazendo negócios. Mas não resistiu ao pedido da filhinha, Cecília, 8 anos, para que retornasse à Barbacena para curtir a data com ela.
Ele chegou na cidade as 20 horas de sábado (14). Uma festa surpresa já estava organizada na casa dos sogros, na Rua José Felipe Saad, bairro São Geraldo. As 5 horas da madrugada deste domingo (15), os últimos convidados saíram. Ele e a esposa, Karina Nogueira de Oliveira, estavam ajeitando as coisas quando viram a fumaça preta no céu que começava a clarear. “Deve ser rebelião no presídio”, imaginou.
Na dúvida, foi até a porta ver o que estava acontecendo. Dali pode ouvir os gritos desesperados dos moradores do prédio vizinho, já em chamas. Breds e sua mulher, Carina, foram os primeiros a chegarem ao local da tragédia. Tentou entrar no prédio pela porta principal, mas as chamas o impediram.
Segundo ele, uma das primeiras pessoas a conseguir deixar o prédio foi Juliana Gava de Faria. “Ela gritava desesperada, pedindo socorro, porque seu marido e sua princesinha, como ela se referia à filha, ainda estavam no prédio”, lembra ele. Karina amparou a mãe e ficou com ela todo o tempo.
“É importante a gente contar o que aconteceu para o maior número de pessoas para que elas possam se prevenir e estar sempre atentas”
Salvamentos
Brads correu para debaixo da sacada e estava instruindo os moradores e fazerem cordas com lençóis para descer, quando um policial chegou e conseguiu uma escada, emprestada de outro vizinho, funcionário da CEMIG. Breds participou do salvamento das primeiras vítimas. Resgatou duas moças que gritavam desesperadas da sacada.
Depois disso, subiu pela escada até o primeiro andar, deu a volta até os fundos do prédio em chamas e tentou arrombar a porta. “Era uma porta muito resistente, de madeira maciça, só consegui na segunda tentativa. E aí veio um calor tão forte, tão carregado de fuligem que eu caí”, relembra.
O vendedor já estava com mãos e pés machucados, os olhos cobertos de fuligem e a respiração ofegante. Mas não desistiu. Instruído pelo pai de que a criança estava entre o 2º e o 3º andar, entrou novamente no prédio para tentar localizá-la. “Eu procurei o quanto pude, mas a sensação que eu tinha era a de que estava derretendo”, afirma.
Breds ainda saiu para tomar um ar, urinou na camisa para cobrir o rosto e não inalar mais fumaça e fez uma terceira tentativa de encontrar a menina desaparecida, sem sucesso. “Os bombeiros chegaram, mais equipados, e não deixaram mais eu procurá-la. Depois que as chamas foram controladas, eu descobri que ela foi encontrada há 3 metros do local em que eu derrubei a porta”, lamenta.
“Me senti muito impotente. Mesmo fazendo tudo o que podia, não consegui encontra-la. Nosso corpo é muito frágil”
Impotência
Segundo ele, a sensação de impotência que experimentou ali foi desesperadora. “Me senti muito impotente. Mesmo fazendo tudo o que podia, não consegui encontra-la. Nosso corpo é muito frágil”, afirmou o herói que, mesmo do lado de fora, ainda ajudou os bombeiros a salvarem outras três crianças e uma cachorrinha, conforme registrado em vídeo.
O pai da Cecília avalia que seu empenho em resgatar a criança esta diretamente relacionado ao fato de ter uma filha. “Eu vi o desespero daquela mãe. E a gente faz pelo filho dos outros o que gostaria que fizessem pela filha da gente”, justifica.
O vendedor foi encaminhado para o Hospital Regional, onde recebeu atendimento médico. Já teve alta e passa bem, embora ainda com ferimentos e sentindo cansaço por conta da quantidade de fumaça inalada.
Em seguida, concedeu entrevista ao Notícias Gerais. “É importante a gente contar o que aconteceu para o maior número de pessoas para que elas possam se prevenir e estar sempre atentas”, afirma.