Douglas Caputo
Especial para o Notícias Gerais
A Advocacia-Geral da União (AGU) divulgou, nessa quinta (14), a transcrição de alguns trechos de vídeo sigiloso da reunião entre o mandatário Jair Bolsonaro (sem partido) e o seu séquito ministerial.
O encontro culminou com o pedido de demissão do ex-ministro Sergio Moro (Justiça), que na ocasião denunciou Bolsonaro por interferir na troca de comando da Polícia Federal (PF). Fato repetidas vezes negado pelo mandatário, embora a transcrição da AGU revele o contrário.
“Eu não posso ser surpreendido com notícias. Pô, eu tenho a PF que não me dá informações; eu tenho a inteligência das Forças Armadas que não têm informações; a ABIN tem os seus problemas, tem algumas informações, só não tem mais porque tá faltando realmente… temos problemas…”, transcreveu a AGU.
Os trechos divulgados para mídia ainda mostram que o interesse do mandatário na PF era proteger o clã e amigos dele. Internautas não perdoaram e memes como “Os filhos justificam os meios”, referência ao escritor Maquiavel, pipocaram na rede.
Não por acaso, o mandatário não economizou nos palavrões e nas carteiradas para tentar pressionar os ministros que participavam da reunião, conforme outro trecho da transcrição publicada pela AGU.
“Já tentei trocar gente da segurança nossa no Rio de Janeiro oficialmente e não consegui. Isso acabou. Eu não vou esperar ‘f.’ minha família toda de sacanagem, ou amigo meu, porque eu não posso trocar alguém da segurança da ponta de linha que pertence à estrutura. Vai trocar; se não puder trocar, troca o chefe dele; não pode trocar o chefe, troca o ministro. E ponto final. Não estamos aqui para brincadeira”, sentenciou Bolsonaro durante a reunião.
Embora não possa interferir na PF, como previsto em lei, Bolsonaro ainda tentou usar o “jeitinho brasileiro” para justificar seu interesse frente às informações da organização policial.
“Quem é que nunca ficou atrás da… da… da… porta ouvindo o que seu filho ou sua filha tá comentando? Tem que ver para depois… depois que ela engravida não adianta falar com ela mais. Tem que ver antes. Depois que o moleque encheu os cornos de droga, não adianta mais falar com ele: já era”, apresenta outro trecho transcrito.
Sem citar diretamente Moro, o mandatário endureceu o tom com os ministros, segundo a AGU. “E me desculpe o serviço de informação nosso —todos— é uma vergonha, uma vergonha, que eu não sou informado, e não dá para trabalhar assim, fica difícil. Por isso, vou interferir. Ponto final. Não é ameaça, não é extrapolação da minha parte. É uma verdade”.
A defesa de Moro também se pronunciou sobre o trabalho da AGU. Os advogados do ex-ministro reclamam que o material divulgado é parcial e compromete a interpretação de quem não teve acesso à íntegra do vídeo.
“A petição contém transcrições literais de trechos das declarações do presidente, mas com omissão do contexto e de trechos relevantes para a adequada compreensão”, disse o advogado de Moro, Rodrigo Rios.
Para a defesa do também ex-juiz da Lava Jato, “a transcrição parcial que busca apenas reforçar a tese da defesa do presidente reforça a necessidade urgente de liberação da integralidade do vídeo”, acentuou Rios.
O ministro Celso de Mello abriu a investigação a pedido do procurador-geral da República, Augusto Aras, que pode decidir sobre a denúncia ou arquivamento do caso.
Uma vez denunciado, o inquérito segue para Câmara aprovar o prosseguimento das investigações. Depois disso, se o Supremo acatar a abertura de ação penal, Bolsonaro será afastado do cargo automaticamente por 180 dias.