Início Especiais PARA SUPERAR OS EFEITOS DA PANDEMIA, ARTESÃS ENCONTRAM ALENTO NOS TRABALHOS MANUAIS

PARA SUPERAR OS EFEITOS DA PANDEMIA, ARTESÃS ENCONTRAM ALENTO NOS TRABALHOS MANUAIS

Foto: Celeste Oliveira / Arquivo Pessoal

Wanderson Nascimento
Notícias Gerais
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Nessa época da pandemia, com as mudanças de rotina provocadas pelo distanciamento social, recomendado há mais de um ano, manter a saúde e o equilíbrio mental tem sido um desafio. Com isso, muitas pessoas têm procurado ocupar seu tempo e seus pensamentos com os respectivos hábitos – seja um novo hobby, a prática de algum esporte ou atividades manuais, que – por sua vez – são cientificamente comprovadas como auxiliares na melhora do estado físico e emocional.

Nesta reportagem especial, o Notícias Gerais entrevistou duas artesãs e um terapeuta ocupacional para entender melhor como essas atividades colaboram para a saúde física e emocional do indivíduo.

A são-joanense Joana Teixeira Davin tem 56 anos de idade, é casada, tem três filhos (35, 32 e 27 anos) e dois netos (14 e 12 anos). Há cerca de um ano ela começou a fazer artesanato por recomendação de seu terapeuta. “Pensei em aprender tocar violão, já que meu filho toca muito bem, mas o ditado já diz ‘santo de casa não faz milagre’; assim como minha filha, que é professora de inglês, começou a me dar aulas, que também não deu certo. Como eu gosto de trabalhos manuais, comecei a reformar caixinhas de bijouterias da minha neta e gostei. Também faço reciclagem com garrafas e potes de vidros, palitos orientais, refis de plástico de sabonetes e aromatizador”, declara. Ela revela que, aos poucos, foi aperfeiçoando as técnicas por meio de vídeos na internet e dicas compartilhadas por outras artesãs no Instagram.

Joana conta que faz peças em MDF, como kit de lavabo, bandejas, caixinhas decoradas e pinturas em garrafas, com os quais ela presenteia parentes e amigos. A atividade ainda é considerada como um hobby, mas ela pretende levar adiante, pois ainda está aprendendo sobre o ofício. “Eu trabalhava com impressão digital, onde também fazia recortes manuais. Por causa da pandemia e de uma hérnia de disco na coluna, estou só em casa, mas pretendo voltar a trabalhar na área de estética”, afirma ela, sobre o futuro novo trabalho.

De acordo com a artesã, a pandemia mudou muito sua rotina e o artesanato surgiu para ajudar na superação desse momento. “(Minha vida) mudou muito, seja profissional, econômica, psicológica e espiritualmente falando e cada um vai tentando encontrar alguma forma de sair dessa pandemia melhor, ou não sofrer tanto enquanto ela estiver presente”.

Ela aponta que o artesanato ajudou tanto, que ela foi dispensada da terapia e parou de tomar remédios para dor e para dormir. Joana também agradece aos profissionais que a ajudaram a vencer e ter esperança em outros negócios. “Tanto a terapeuta, como o fisioterapeuta, o pilates e a esperança desse novo trabalho, que é uma clínica de estética da minha nora e do meu filho. Estamos esperando acabar a onda roxa para começarmos no novo endereço. Mas acho que o trabalho de artesã eu não vou parar, pois estou adorando. Quem sabe, no futuro, começo a vender meus trabalhos”, frisa.

Ela finaliza recomendando a prática da atividade como uma espécie de terapia. “Esse trabalho artesanal me ajudou muito nesse tempo confinada em casa. Espero que outras pessoas também consigam fazer ou aprender algum tipo de trabalho artesanal para ficarem melhor física e espiritualmente”, conclui.

Exemplo dos trabalhos em crochê feitos pela Celeste.
(Foto: Arquivo Pessoal)

A também são-joanense Celeste Auxiliadora Pires de Oliveira tem 60 anos de idade, três filhas (36, 35 e 32 anos) e já conta com uma experiência bem vasta como artesã, trabalhando também como chef de cozinha. “Ultimamente faço crochê, mas já fiz arraiolos, bordados e artesanato com tecidos. Não é a minha única atividade, sou sócia-proprietária de um restaurante, junto com minhas filhas, e sou responsável pela cozinha”, elenca.

Ela relembra que faz artesanato desde os 18 anos, quando cursou magistério e, no curso de Educação Artística no Conservatório, se apaixonou pela arte de criar com as mãos. Celeste defende que, com o fato de ter que ficar mais em casa, passou a ter mais tempo para se dedicar ao artesanato – atividade que a ajudou a enfrentar esse cenário da pandemia. “Com certeza o trabalho manual tem me ajudado muito. No momento que estou criando, me transporto para meu interior, não me permito pensar coisas ruis, entro num estado de prece, de agradecimento, procuro sempre elevar meus pensamentos e sentimentos”, explica.

Assim como Joana, Celeste também acredita nos benefícios da atividade. “Trabalho manual é uma das melhores terapias de auto-conhecimento, além de fazer bem para corpo e mente, faz bem a alma. Conselho que dou a todos é que busquem uma atividade com as mãos. Melhor terapia e ainda pode trazer uma renda extra”, enumera.

Benefícios do artesanato para a saúde

A reportagem do NG conversou também com Anderson Coelho, presidente do Conselho Regional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional de Minas Gerais (Crefito-4). De acordo com ele, a mudança abrupta de rotina e o isolamento social, consequências da pandemia de Covid-19, podem causar diversos problemas.

“Ansiedade, depressão, transtorno do pânico, estresse, confusão e raiva são alguns impactos psicológicos negativos. Entre os diversos fatores que podem desencadear os sintomas, estão o medo da infecção, frustração, perdas financeiras e o sentimento de não produtividade”, narra.

O profissional destaca que o isolamento também pode provocar a desorientação e, nesse sentido, trabalhos manuais podem aliviar os sintomas. “As atividades e a rotina ficam confusas, bem como o cansaço e a dificuldade em manter a concentração aumentam. Para lidar com todos esses impactos, as atividades manuais têm sido utilizadas, trazendo benefícios físicos e mentais”, comenta.

Anderson Luís Coelho é presidente do conselho mineiro da categoria.
(Foto: Mariana Silva/Assessoria EEFFTO)

Segundo Anderson, as atividades manuais podem ser definidas como um conjunto de tarefas realizadas com as mãos para construção de um produto final, sendo que o objetivo – normalmente – está associado ao desenvolvimento pessoal, criativo ou, até mesmo, a um momento de recreação.

Na visão dele, os benefícios dessas atividades são inúmeros, tanto em crianças, como em adultos. “No caso das crianças, as atividades manuais contribuem para o desenvolvimento motor, beneficiam os aspectos emocionais e a aprendizagem, já que favorecem a criatividade e a imaginação”, sinaliza.

Já no caso dos adultos, os benefícios são principalmente emocionais e cognitivos: “diversos estudos comprovam que as atividades manuais ativam o sistema de recompensa do cérebro, ajudando na liberação de dopamina, resultando em uma sensação de bem-estar e relaxamento, diminuindo também os níveis de estresse”.

“Essas atividades ajudam também na estimulação e preservação de funções cognitivas como atenção, concentração e memória. Também promovem ganhos emocionais, pois fortalecem a autoestima, a capacidade de tomada de decisões e a sensação de capacidade produtiva”, completa.

Além do artesanato e outras atividades manuais, também existem outras práticas como a música, a meditação e a leitura, que estimulam o sistema nervoso, trazendo todos os benefícios citados. “[…] Essas práticas aumentam significativamente a qualidade de vida, estimulam o cérebro e amenizam os níveis de estresse”, conclui.

“Em um momento tão delicado como a pandemia, os trabalhos manuais são muito mais do que uma atividade para passar o tempo”

– advoga o presidente do Crefito MG, Anderson Coelho.

* Contribuíram na produção desta matéria: Raruza Keara (jornalista, artesã-empreendedora, professora e colunista do Notícias Gerais) e Arthur Raposo Gomes.

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